A discussão acerca da legalidade do desconto aplicado aos beneficiários do auxílio pré-escolar tem sido tema recorrente nos tribunais. A controvérsia gira em torno do artigo 6º do Decreto n.º 977/1993, que ao instituir esse desconto sem o respaldo de uma lei específica, acabou por violar o princípio da legalidade, conforme estabelecido pela Constituição.
O princípio da legalidade, consagrado no artigo 37 da Constituição Federal, impõe que a Administração Pública somente pode atuar em conformidade com a lei. No caso do auxílio pré-escolar, o desconto no contracheque dos beneficiários foi implementado por meio de um ato normativo infralegal, sem que houvesse previsão legal para tanto. Dessa forma, o ato extrapolou a função regulamentar do decreto, ferindo diretamente a ordem constitucional.
Jurisprudência Favorável
Essa tese já vem sendo reconhecida nos tribunais, especialmente nas Turmas Recursais da Justiça Federal. Um exemplo disso é o julgamento do processo n.º 0517718-49.2013.4.05.8300, que decidiu pela ilegalidade do desconto:
“ADMINISTRATIVO. AUXÍLIO-CRECHE. ART. 75, DA RESOLUÇÃO 14/2008 DO CJF QUE ESTABELECE DESCONTO NOS CONTRACHEQUES DOS SERVIDORES E MAGISTRADOS DA JUSTIÇA FEDERAL DE VALORES A TÍTULO DE CUSTEIO PARCIAL DO AUXÍLIO-PRÉ-ESCOLAR. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 37 E 95, III, DA CF. RECURSO IMPROVIDO.”
(JFPE, Primeira Turma Recursal, Processo n.º 0517718-49.2013.4.05.8300, Rel. Juiz Flávio Roberto Ferreira de Lima, Julgamento; 12/2/2014)
O Tribunal entendeu que o custeio do auxílio pré-escolar não poderia ser descontado dos contracheques dos servidores, uma vez que tal imposição carecia de suporte legal, sendo baseada apenas em atos normativos infralegais, o que contraria o princípio da legalidade.
Decisões de Outras Cortes
Outras Cortes também têm seguido esse entendimento. No Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por exemplo, foi decidido que o desconto é ilegal:
“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO ORDINÁRIA COLETIVA – IRRF – AUXÍLIO CRECHE OU PRÉ-ESCOLAR – CUSTEIO – DECADÊNCIA QUINQUENAL… O Decreto nº 977/93, norma secundária ou de execução da lei (art. 84, IV, da CF/88), é ilegal ao, extrapolando sua função regulamentar, estatuir custeio do beneficiário, dado que, restringindo ou onerando o gozo do direito previsto na Lei nº 8.069/90 (e na CF/88), invadiu seara de lei (norma primária), contrariando-a ou mitigando seus efeitos.”
(AC 200533000223294, Juiz Federal Renato Martins Prates, TRF1 – Sétima Turma, e-DJF1 Data: 03/08/2012)
Nessa decisão, o Tribunal reitera a ilegalidade do custeio imposto aos beneficiários do auxílio pré-escolar, afirmando que a medida ultrapassou a função regulamentar do decreto.
Diante dessas decisões, fica evidente que o desconto aplicado aos beneficiários do auxílio pré-escolar não possui respaldo legal. O entendimento dos tribunais tem sido uniforme ao reconhecer a ilegalidade dessa cobrança, consolidando a jurisprudência favorável aos servidores prejudicados. Assim, aqueles que foram afetados por esses descontos têm o direito de buscar a restituição dos valores indevidamente descontados.